Criança, Alimentação e Comportamento Espelho. Qual é A Ligação?
- Victor Tarini

- 25 de nov. de 2022
- 3 min de leitura
“...Doutor eu trouxe meu filho aqui porque o médico dele disse que ele precisa emagrecer e que se continuar assim, vai ficar diabético e hipertenso!” Assim disse a mãe de um jovem paciente que certa vez atendi. De fato, o menino aparentava estar bem fora do peso, mas ali diante de mim, não me parecia um problema tão sério. Afinal, a infância é marcada muito mais pela falta de apetite do que pela gula. Outros tempos... Quando eu era criança (e já faz muito tempo), sempre tive dificuldade de ganhar peso. Minha mãe estava sempre em busca de uma receita nova para me deixar mais forte, ovo de pata com biotônico Fontoura, gemada com suco de laranja, bife de fígado e por aí vai. E mesmo com tudo isso, eu não engordava. Fui uma criança adoentada até a adolescência e mesmo depois, fui um “magrelo crônico”. Dava dó de ver, “de frente parecia de lado, de lado parecia sumir”. Minha professora no primário adorava segurar a minha mão de tão pequena.

Macarrão Instantâneo com Nuggets
Talvez se eu tivesse nascido algumas décadas depois a história seria diferente, talvez, se minha mãe me desse macarrão instantâneo com Nuggets eu também poderia ser rechonchudo. É verdade, o que o meu jovem paciente vinha comendo (no almoço e no jantar) nos últimos anos era macarrão instantâneo e nuggets! Quase cai da cadeira quando a mãe me disse: “não adianta oferecer outra coisa, ele não come!” Vi que a conversa ia ser longa, então tratei logo de iniciar a avaliação. Bioimpedância, antropometria, análise das curvas de crescimento e o diagnóstico: obesidade grau II.
Notícia Ruim
Nunca é fácil dar notícias ruins, principalmente quando isto se aplica a crianças. Se de um lado o prognóstico é bom (afinal, tem uma vida inteira pela frente para mudar a situação), do outro a expectativa é ruim, porque a criança é totalmente dependente e precisará da ajuda dos pais (que, por sua vez, não entendem a gravidade da situação, sendo até responsáveis pelo quadro de obesidade no qual o filho se encontra). Sim, responsáveis! A criança não faz as compras no supermercado e não cozinha, então não pode ser culpada.
Não Sei Mais o Que Fazer
Então eu perguntei: “A senhora pode me contar a rotina do seu filho desde a hora em que acorda até a hora de dormir?” Ela me respondeu: “Sim, é a mesma todos os dias, ele estuda à tarde, então levanta às onze horas, senta no sofá e começa a jogar videogame. Ao meio-dia senta à mesa para almoçar e é sempre a mesma coisa, macarrão instantâneo e nuggets, mas de “air fryer”! Então vai para a escola e volta no final da tarde. De Lanche ele só come bolinho recheado ou pão de queijo ou croissant com refrigerante e quando volta para casa, janta a mesma coisa, “macarrão com nuggets”! Não sei mais o que fazer! Completa.
O “X” e o “Y”
Olha só, antes de criticar vale a pena tentar entender o que acontece. Por um instante fiquei sem saber “quem era refém de quem”, o menino, por só comer aquilo que a mãe oferecia ou a mãe por sofrer com o medo do filho passar fome por não comer outra coisa. Parece aqueles problemas de matemática em que você precisa achar o “X” e o “Y”, mas faltou nessa aula. Foi então que quis saber sobre os hábitos alimentares dos pais. “TCHAN, TCHAN, TCHAN, TCHAN! Olha, não vou dizer que fiquei surpreso, porque até já desconfiava. Só frituras! Batatas, nuggets, kibes, omeletes, massas e tudo mais o que for amarelo brilhante que você possa imaginar! Frutas, verduras e legumes? Não, obrigado!
A Mudança Nunca É Fácil
Agora, desvendada a origem do problema, ficou mais clara a intervenção (eu disse clara, não simples). Não foi fácil convencer aos pais de que eles precisariam mudar seu estilo de vida e hábitos alimentares para tratar o problema do filho. Foi um processo lento, mas produtivo. Mês a Mês, os três compareciam no consultório e como um time em campo comemoravam cada quilo de gordura perdido (e cada novo legume consumido). Assim foi a transformação. Mas só foi possível depois que os pais perceberam qual era a “cadeia de comando” e que as crianças são reflexos de seus pais.



Querido doutor, achei muito pertinente seu texto e bastante atual. Um dia , no supermercado, vi uma mãe que se ajoelhou diante da prateleira de Miojo e disse bem alto: obrigada por criar meus filhos para mim!!!!!!!!!!!!!!!!! A praticidade e a preguiça andam de braços dados com algumas famílias; não se preocupam com a qualidade dos alimentos, apenas em encher o bucho dos meninos!
As mudanças, no caso das crianças e jovens que se alimentam mal são bastante demoradas, mas com bom exemplo e força de vontade não são impossíveis!
Eu conheço a professora que adorava segurar sua mãozinha......